Sábado, 18 de Novembro de 2006

De Volta Aqui!... Vinte anos depois?

Nó na garganta e mar(es) de olhos. Só podia ser… O que não parecia é que passasse tão depressa. O tempo. O Coelho de Alice diz «Não há tempo! Não há tempo!» … Tempo não há. Há não tempo.

E portanto cachopos, gaiatos, putos: projectos d’algo… a caminho da escola, caminho bravo, caminho de terra e lama, caminho por entre tantas árvores (ainda). E, depois, “take the long way home” como diz a canção. Brincadeiras nessas matas, nesses cantinhos secretos debaixo do grande pinheiro. E ainda me lembro d’outras! A revolução das cadeiras! Alunos e pais, desta vez sem carros, mas empunhando… cadeiras! É que todos à espera da escola e nada!... «Portugal! Se fosses só três sílabas… de plástico, que era mais barato…» … Grande O’Neill… Não havia nem cadeiras, nem secretárias ou mesas… nada! Não havia nada para os meninos e meninas aprenderem as coisas do mundo. E falando outra vez de caminhos. Como era incrível, um desafio digno do mais avançado jogo de playstation, a caminhada de Rio de Mouro até cá abaixo à escola! Sim, que não havia tanta estrada de alcatrão, tanto carro, tanto prédio (e viv’ó progresso) como agora… No Inverno, os milhares de buracos e buraquinhos enchiam-se de lama que Deus la deu e o desafio era não botar o pezinho lá dentro (ponh’aqui o seu pezinho…). Resultado inevitável: moda Outono/Inverno em tons castanhos, patines húmidas, salpicos nada subtis em qualquer canela. 1986. Há vinte anos. E neste sorriso Mona Lisa continuo, com o tal mar(es) de olhos. Da lama e do cimento, da desnuda paisagem quase sem cor se foi fazendo jardim. Entre o riso e confusão de todos nós, miúdos do 7º ano, andavam professores e funcionários a deitar sementes na terra, a lançar temperos na panela, a poisar azulejos nos fornos. E assim choupos enormes de sombras, assim flores. Assim bons cozinhados, prazer de Pantagruel na nossa cozinha. Assim outra cor nas paredes, dando sorrisos d’azulejo ao Mestre Leal da Câmara… Ele deve gostar, pois que criou sempre uma casa por onde passou, uma casa de todos, para todos. Comunidade: o que todos foram criando nesta escola pouco a pouco. E, na idade que tínhamos, fomos aprendendo coisas que rimaram: Irmandade, Felicidade, Cumplicidade. Porque a Escola Secundária de Rio de Mouro tinha poesia. Tem.

 

Agora em breve narrativa. E foi num dia que até lhe recordo a luz, sentado nas tais cadeiras e mesas que já existiam há muito, que um desses abnegados missionários, um s’tor de Filosofia, disciplina mais estranha, nos disse em jeito de pergunta socrática: «Dizei-me porque não apresentais vós as tarefas de Philosophia na forma de sublimes representações (ou autos) de theatro?» (Atenção que isto não foi assim há tanto tempo, não se deixem enganar, é só para ficar mais literário, mais místico.). Corria o ano de 1990. O S’tor era o Carlos Amaral (e é, um bom amigo). E, a partir daí foi a “lókura”! Um festival! Toda essa turma do 10ºC2 – 89/90 – se dividia em grupos e encenava as suas pequenas peças, conforme o tema…. O resultado era um mini festival de teatro que decorria nos períodos das aulas de Filosofia. E houve de tudo! Só para falar do caso do meu grupo: primeiro tema, “Apologia de Sócrates”. Recriação do tribunal, com abertura com música dos Beatles e duas tochas gigantes só para dar “aquele” ambiente… Maravilha… Já para o fim da recriação, o público mais asmático ou mais sensível de pulmões deixava de emergência a sala por entre grossas colunas de fumo. Algures numa sala do pavilhão D, duas manchas assinalaram durante anos o grandioso show! (será que Moreira, o Subtil, descobriu?). Outra: tema egípcio… Cenografia de um templo egípcio. Do que se lembraram estes aspirantes a teatreiros? Toca de ir “desviar” uma areiazita a umas obras e, de bicicleta, levá-la… Chegando à sala, no dia da representação, espalhá-la pelo chão, mesas, cadeiras… Mas estávamos no deserto ou quê? Outras tantas dezenas de velas, etc.…. E no fim sempre o espanto d’existir, como prega a Filosofia. Para limpar a sala, todos a ajudar… Os nossos colegas, as auxiliares, todos, todos a colaborar, a cooperar, a fazer acreditar no pontapé no “im” da palavra “impossível”.

E foi com este espírito que se criou o Teatro TapaFuros, uma das estruturas profissionais de Sintra, este ano a comemorar 16 anos. Foi este carinho de professores, de funcionários, de colegas que ajudou a criar o grupo com a energia e a força que o caracterizam e que lhe permitem criar espectáculos para a infância, teatro de rua, performances e animações, espectáculos de música, poesia…

E, quando cada um, que no ano de1991, partiu para outras aventuras, universidade e etc., deixou-se no ar … Reticências… e tudo o que elas deixam a pairar: mistério, magia, o que fica sempre por dizer… O que sobra para o imaginar… O teatro do grande palco que é a vida!

 
Saúde, Leal da Câmara!
 
Rio de Mouro, 18 de Outubro de 06
 
Rui Mário
(eternamente agradecido aluno)

reticências preenchidas por teatroreticencias às 23:31
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1 comentário:
De Cadeiras e mesas a 10 de Abril de 2008 às 10:51
Gostei muito da parte "mas empunhando... cadeiras


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